quarta, 24 de abril de 2024

Carro elétrico não recebe incentivo no Brasil

23 setembro 2011 - 16h40
Modelos têm a mesma taxação de impostos de veículos a gasolina

Carsale

Em poucos anos, os carros híbridos (que compartilham motores a combustão e elétrico) e puramente elétricos despontaram como uma opção alternativa e ecológica de curto e médio prazos para os problemas que o mundo vem enfrentando nas últimas décadas, como aumento da poluição ambiental, aquecimento global e esgotamento de recursos não renováveis (combustíveis fósseis), como petróleo, gás e outros. Atualmente, existem 3 milhões desses veículos circulando pelo mundo. No Japão, eles representam a significativa parcela de 11% da frota de carros novos e, nos Estados Unidos, cerca de 2,5%, segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). A previsão é que até 2020 de 10% a 15% da produção automotiva mundial seja de veículos verdes, de acordo com Paulo Sérgio Kakinoff, presidente da Audi para o mercado brasileiro.



Apesar de o Brasil ter uma vocação ecológica natural – é um dos maiores recicladores de matérias primas básicas e pioneiro no programa de carros Flex movidos com combustível vegetal - e ostentar a posição de quinto maior mercado de automóveis do mundo, não existe ainda no país uma política de governo de incentivo à produção, comercialização e infraestrutura (redes e postos de abastecimento para recarga rápida) para esse tipo de veículo, com reduzida emissão ou emissão zero de gases poluentes.

Com tanto potencial energético no país, ainda são raras as empresas que desenvolvem ou comercializam carros elétricos por aqui – a única é a concessionária de energia de Itaipu, que monta esses modelos em parceira com a Fiat desde 2007. As outras são Copel e CPFL, que utilizam esses veículos ou modelos importados em suas frotas internas.



Atualmente, o maior problema enfrentado pelas concessionárias de energia está no alto custo de adaptação (todos os componentes são importados), nas dimensões e peso das baterias, sem falar no longo tempo de recarga e na reduzida autonomia, que ainda inviabilizam a venda desses veículos em escala comercial.

Um importador independente, caso da Cam Brasil, tentou trazer esses automóveis de fora (o Reva-i, da fabricante indiana Mahindra), mas não foi adiante e encerrou as suas atividades.



Em setembro do ano passado, a empresa EBX, do empresário Eike Batista, anunciou planos de construir uma fábrica de carros elétricos, com capacidade para 100 mil veículos por ano, utilizando tecnologia japonesa e européia, na cidade de São João da Barra, no Rio de Janeiro, mas o projeto até agora não saiu do papel - nem deve decolar tão cedo. Segundo a assessoria de imprensa da holding, “não há novidades sobre o assunto”.

No momento, apenas a Ford (com o Fusion Hybrid) e a Mercedes-Benz (S 400 Hybrid V6) disponibilizam modelos para a venda direta ao público, mesmo assim a preços entre R$ 134.000 e R$ 488.000, sem o aumento do IPI. A Toyota deve trazer em breve o híbrido Prius e a Renault estuda a importação do recém-lançado Twizy.

Mesmo contando com iniciativas pioneiras e isoladas, aqui os veículos elétricos e híbridos ainda são tratados como carros comuns, recolhendo os mesmos tipos de taxas e impostos (IPI, ICMS, IPVA e Imposto de Importação) que modelos a gasolina. Com uma frota ainda incipiente (há apenas 72 veículos licenciados no país), só agora o assunto começa a despertar o interesse das autoridades de governo.



Depois de mais de um ano de discussões e indefinições, o governo brasileiro retomou em julho os estudos para a criação de um plano a fim de regular o mercado de carros elétricos no país. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, a primeira etapa do programa seria o incentivo à importação, de modo a criar uma demanda e desenvolver uma futura estrutura de abastecimento. O próximo passo seria criar tecnologia para a fabricação local de veículos elétricos. O maior desafio é o desenvolvimento de baterias mais baratas e com maior autonomia de quilometragem. Também está em análise uma eventual redução do IPI e de Imposto de Importação para esses modelos.

“O carro elétrico movido exclusivamente a bateria é uma inovação, mas ainda não possuimos a tecnologia de fabricação nem escala comercial. Hoje, esse tipo de veículo tem sua comercialização inviabilizada por causa do imposto elevado e pelo alto custo de produção. O carro híbrido é mais viável a curto prazo. Já o carro elétrico é mais eficiente, pois gasta bem menos e polui menos o meio ambiente. O consumo de energia não é maior que o de um aparelho de ar-condicionado. A tendência a longo prazo é ele funcionar também como um no-break para as residências”, afirma Jayme Buarque de Hollanda, presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira de Veículo Elétrico (ABVE).



Segundo o executivo, existem algumas iniciativas sendo tomadas em vários ministérios e a redução do IPI é uma questão de bom senso. “O governo deveria baixar a alíquota para os carros verdes. Hoje, ela enquadra apenas o carro híbrido e deixa o elétrico de fora. O carro elétrico, se fosse vendido ao público no Brasil, sairia muito mais caro que o movido a gasolina. O híbrido recolhe 25% de IPI. Para se ter uma idéia, um modelo popular Flex, que é mais poluente e menos econômico, paga apenas 7% de imposto. É uma medida incoerente porque o mundo todo está subsidiando o carro elétrico e aqui não há nenhum incentivo. Vai contra a tendência de massificação global do uso desses veículos”, afirma.

Consultada sobre o assunto, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) informou que a discussão está restrita ao governo federal e que, no momento, não está envolvida no assunto. Segundo a entidade, “o que existem são iniciativas individuais de montadoras em nível global”.

Para Hollanda, o veículo elétrico tem grande viabilidade no Brasil, um país abundante em recursos hídricos, que utiliza em grande parte a energia gerada por usinas hidrelétricas, além de ser excelente fonte de energia solar, que também pode servir para o abastecimento desses modelos. Segundo ele, o carro elétrico poderia aproveitar aqui a capacidade ociosa dessas usinas, que à noite desligam seus geradores devido à baixa demanda, para se reabastecer. “Esta é a maior virtude desse tipo de veículo. Ele poderia otimizar o investimento e contribuir para o desenvolvimento do setor elétrico no Brasil”, diz.

Quem já oferece os modelos

De olho no mercado brasileiro, este ano a Nissan apresentou o seu mais novo modelo, o Leaf, num evento internacional sobre mobilidade urbana e mudanças climáticas nas grandes cidades, que reuniu prefeitos das 40 maiores metrópoles do mundo na capital paulista.

Recentemente, a Prefeitura de São Paulo assinou um protocolo de intenções com a AES Eletropaulo e a Nissan para avaliar a viabilidade de introdução de carros elétricos na frota do município, incluindo a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). A previsão inicial era incorporar 40 a 50 desses veículos até 2012.

Em junho, a Mitsubishi mostrou o i-Miev em São Paulo e em Brasília, oferecendo o modelo para test-drive, a fim de sensibilizar as autoridades para a necessidade de as cidades terem veículos mais limpos. Até o momento, nenhum desses carros foi vendido ao público.

Este ano, São Paulo e Curitiba deverão iniciar os testes com o ônibus verde e-Bus K9, primeiro veículo elétrico de transporte coletivo desenhado e produzido pela montadora chinesa BYD, que utiliza painel solar e baterias, dispensando a rede suspensa de energia para circular. O veículo tem programa de testes agendado em Santiago, no Chile, e em Lima, no Peru.

A empresa, líder global na produção de baterias de íon de lítio, é uma das mais avançadas no mundo em tecnologia de acumuladores para carros elétricos. Recentemente, a corporação desenvolveu uma bateria de fosfato de ferro e lítio (chamada Fe), de baixo custo e alta eficiência energética, que barateou os preços de seus veículos. Elas equipam os modelos e6 (100% elétrico, plug-in), F3DM e S6DM (híbridos, dual mode, a combustão e elétrico).

Só para se ter uma ideia, o custo atual de um protótipo de carro elétrico montado no Brasil beira os R$ 140 mil – só a bateria de cloreto de sódio e níquel, composto químico já ultrapassado, responde pela metade desse valor (R$ 70 mil).

Este mês, a Petrobras passou a apoiar o projeto de Itaipu, de desenvolvimento de um carro elétrico nacional. A concessionária de energia já montou, em parceria com a Fiat, 58 unidades da perua Palio Weekend, que circulam há quase dois anos dentro da área da usina, mas que não estão disponíveis para venda ao público. Em outubro, o modelo deverá ser substituído provavelmente pelo Uno Ecology.

O Brasil já começa a ficar para trás também na América do Sul. Recentemente, a Argentina estabeleceu uma quota de 300 veículos híbridos e elétricos por ano com apenas 2% de imposto de importação para empresas com fábricas no país. E o Chile, onde a importação e a comercialização desses modelos são liberadas, inaugurou uma estação de recarga rápida na cidade de Santiago. Estados Unidos, Canadá, Europa, Japão e China têm programas de estímulo, com redução de taxas ou impostos, voltados para a venda desses modelos em seus mercados. Os países europeus também estão bem avançados na implementação de programas-pilotos em grandes cidades.

Na opinião de Hollanda, o fato de o Brasil possuir um programa para o etanol, não é um impecilho para a comercialização de veículos elétricos no país. Ao contrário, os ônibus e caminhões híbridos (com motor a combustão alimentado por etanol e motor elétrico) poderiam permitir a substituição dos veículos a diesel no transporte pesado e de passageiros. “Seria o veículo mais limpo do mundo”, concluiu.

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