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Gravações da Uragano levam MPF a investigar Geraldo Resende e Marçal

Gravações da Uragano levam MPF a investigar Geraldo Resende e Marçal

23 novembro 2011 - 11h17Por O Estado
O MPF (Ministério Público Federal) investiga os deputados federais Geraldo Resende e Marçal Filho (ambos do PMDB) por “crimes praticados por funcionários públicos contra a administração em geral” e “corrupção passiva”, com base em gravações realizadas pela Polícia Federal durante a Operação Uragano.

O inquérito, aberto pela PGR (Procuradoria-Geral da República, responsável pelo MPF), foi autuado em 8 de outubro no STF (Supremo Tribunal Federal) –responsável por autorizar e acompanhar as apurações por conta do foro privilegiado dos parlamentares federais sul-matogrossenses- e será analisado
pelo ministro Marco Aurélio.

Conversas entre Geraldo e Marçal com o ex-secretário de Governo da prefeitura de Dourados na gestão e Ari Artuzi, Eleandro Passaia, foram gravadas pela PF durante a investigação policial. A Uragano foi deflagrada em setembro do ano passado, e apurou uma série de irregularidades na gestão de Artuzi à frente da prefeitura douradense.

A Polícia Federal remeteu ao MPF as provas que remetiam a autoridades federais e as que gozam de foro privilegiado, para que sejam processadas nas cortes competentes. Além do STF, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) conduz inquérito aberto a pedido do MPF com base em provas da Uragano, tendo como investigado o desembargador Claudionor Miguel Abss Duarte.

Passaia colaborou com a PF na Uragano -assinado acordo de delação premiada-, realizando gravações em áudio e vídeo de conversas com agentes públicos e empresários. Com Geraldo, o ex-se-cretário tratou do “retorno” a ser pago ao deputado por emendas parlamentares para a construção de postos de saúde.

A conversa com Marçal envolveu o repasse de R$ 2 milhões que o então candidato a deputado federal tentava obter de Artuzi, também afirmando que suas emendas exigiam “retornos” a ele. Geraldo e Marçal –este por meio de nota- negam as irregularidades.

Entenda o caso

Deflagrada em setembro de 2010, a Operação Uragano levou à prisão 28 pessoas, incluindo o exprefeito Ari Artuzi, o vice Carlinhos Cantor, a exprimeira- dama Maria Artuzi, além de nove vereadores, secretários municipais e empresários. Todos foram acusados de participar de um esquema de desvio
de verbas, cobrança e pagamento de propina na administração de Dourados. As operações foram subsidiadas com gravações realizadas pelo então secretário de Governo da prefeitura, Eleandro Passaia. As provas foram remetidas ao MPE (Ministério Público Estadual), que apresentou denúncias contra cerca de 60 pessoas, e ao MPF.

Em uma dessas gravações, Passaia ouviu o ex-deputado estadual Ary Rigo dar detalhes sobre o funcionamento de um mensalão na Assembleia Legislativa, que beneficiava os então parlamentares estaduais com R$ 120 mil no mínimo, além de destinar recursos a outros poderes –como R$ 900 mil para
desembargadores do TJ-MS e R$ 300 mil para o MPE.

O próprio Ministério Público Estadual investiga o caso, e aguarda o julgamento de pedido de quebra de sigilo bancário da Assembleia. O ministro Gilson Dipp, do STJ, autorizou a quebra de sigilos bancário e fiscal na Casa de Leis em inquérito aberto pelo MPF com base na Uragano.

Conversa entre Passaia e Geraldo tratou de obras em postos de saúde

A gravação entre Passaia e Geraldo foi realizada por volta das 12h de 19 de junho de 2010, segundo informações do inquérito da PF. Conforme relatou o parlamentar a O Estado, a conversa se deu em seu escritório.

O foco da conversa seria o valor a ser repassado ao parlamentar para a construção de postos de saúde no município. Na gravação, o deputado reclama sobre a substituição da empresa que seria responsável por obras no município e da demora da equipe de Artuzi para providenciar obras.

Passaia fala com Geraldo sobre os postos de saúde. “O senhor pode fazer a conversa direto com a construtora?”, questiona. Segundo Geraldo, quem havia ficado responsável por tal obra era “o Torraca”. “Agora tem uma pessoa minha que vai ver isso, uma pessoa, uma pessoa que tava inclusive como um dos interessados nestes postos, eu vou pedir para ele conversar com esse pessoal para o ver o quê que resolveu”, emendou o deputado.

Na sequência, Passaia fala de ‘uma conta” que fazia. “Nós trabalhamos com o posto de saúde, é 5% para os deputados. Certo?”, questiona. “Eu não sei quem comanda isso, no caminho eu vou conversar com a pessoa para ver o que é tratado, o quê que tá vendo”, emenda o deputado. “Isso aí é uma coisa que do jeito que tava, uma hora para outra ia ter escândalo aí. A pessoa, o meu interlocutor para esse caso, eu vou dizer para a pessoa que ela vá lá e converse contigo, então?”, prosseguiu Geraldo.

Marçal Filho afirma que exige ‘retorno’ em todas as suas emendas

Na manhã de 14 de junho de 2010, Marçal fala com Passaia e com uma mulher –que não foi identificada na gravação da PF- sobre sua campanha à reeleição. Na conversa, o então candidato a deputado federal pede R$ 2 milhões para sua campanha, afirmando que Artuzi tinha dinheiro para disputar sua reeleição em 2012.

Conforme Marçal, a colaboração naquele momento representaria “economia” na campanha futura, porque se ele pensa em ser candidato a prefeito de novo, comigo a pretenso candidato a prefeito ou o Geraldo, seja como for, vai ter que gastar muito mais do que ele gastaria se ele tivesse apoio de alguém, alinhavasse compromissos agora”.

Na gravação, Marçal afirma que em todas as suas emendas “o cara tem que dar um retorno para mim”. Conforme o inquérito, o ‘retorno” envolvia recursos financeiros. A conversa, segundo a PF, ocorre em meio ao programa de Marçal em uma rádio.

Deputados federais tratam gravações como ‘ataques’

Procurados pela reportagem de O Estado, os deputados federais Geraldo Resende e Marçal Filho negaram
o conteúdo das gravações feitas por Eleandro Passaia durante a Operação Uragano. Os parlamentares sustentaram que o objetivo das gravações era o de lhes atingir politicamente.

Por telefone, Geraldo informou que move procedimentos nas esferas cível e criminal contra Eleandro Passaia por conta das suspeitas contra ele levantadas a partir da divulgação das gravações da Uragano –além de reportagens sobre a operação, Passaia lançou um livro a partir do conteúdo das gravações.

Geraldo Resende negou ter tratado de algum tipo de retorno financeiro com Passaia. “A única coisa que pedi era o retorno na qualidade da obra, com idoneidade”, salientou. Geraldo negou ter relação com os ilícitos atribuídos ao ex-prefeito Ari Artuzi, ressaltando ser autor de 18 procedimentos contra o ex-prefeito.

“O Passaia tentou me colocar na mesma pocilga que ele frequentava”, disparou o deputado. Geraldo, por meio de seu advogado, procurou o STF para pedir vista ao inquérito, e disse que, caso a apuração tenha prosseguimento, está disposto a abrir seus sigilos bancário, fiscal e telefônico.

Após a entrevista, concedida na sexta-feira, a assessoria de Geraldo emitiu nota reiterando que, “caso seja instaurado algum inquérito a respeito deste assunto”, o parlamentar está pronto para colaborar. Segundo a nota, “ao final de tais investigações vou receber mais um atestado de idoneidade moral do STF”.

Ainda segundo a nota assinada pelo deputado, “qualquer sensacionalismo que se fizer a respeito deste assunto, em qualquer tipo de mídia, não passará de mais uma tentativa de macular o nome de uma pessoa cujo maior patrimônio é a honra.

O objetivo que está por trás de tal sensacionalismo, na verdade, é o prenúncio da campanha eleitoral que se avizinha, numa tentativa sórdida e desesperada (e infrutífera) de desconstruir minha pretensão de disputar a prefeitura de Dourados”. Geraldo tenta emplacar sua candidatura pelo PMDB nas eleições de 2012.

Em nota, deputado diz que acusações tentam ‘enlamear’ honra de inocentes

A reportagem não conseguiu localizar Marçal Filho. Contudo, em nota, sua assessoria informou que o deputado “não teve acesso ao conteúdo do pedido de investigação formulado ao Supremo Tribunal Federal”, nem aos inquéritos da Polícia Federal resultantes da Operação Uragano.

“Entretanto, mesmo o desconhecimento dos detalhes das investigações não o impede, por ora, de deixar registrado seu absoluto repúdio às acusações mendazes que lhe são dirigidas, a partir de depoimentos e gravações ilegais realizadas com a única motivação para enlamear a honra de terceiros inocentes”, prossegue a nota.

Marçal também informa no comunicado que se coloca “à disposição da justiça” para esclarecimentos sobre o caso.

Conversa entre Marçal e Passaia

Marçal Filho – Se ele quiser que eu faça algum compromisso futuro, presente ou futuro, com ele, eu preciso de muita grana (incompreensível). Sele quiser dar dinheiro pra mim (sic) fazer a campanha, dá dinheiro pra mim (sic), mas eu quero é dinheiro, não quero conversa. Eu preciso de uns dois milhões pra fazer essa campanha.

Eleandro Passaia – Dois milhões?

Marçal – Eu preciso arrumar dinheiro senão eu vou, vou me ferrar. Porque eu não tenho dinheiro, o André não quer dar, quer dá (sic) uma mixaria que não dá (sic) nem pra começar. Ele vem com aquele negócio: Você vai me apoiar pra prefeito? Apoio, eu apoio. Eu não tenho nenhuma tara em ser prefeito, não. Agora, ele tem que me dar dinheiro, ele tem que me dar dinheiro pra minha campanha, pra eu me eleger, senão eu tô (sic) morto. A conversa é isso, curta e grossa. Tem que dá pra (sic) campanha, tem que ser agora, não adianta...O resto é bobagem. Nome eu tenho, coisa eu tenho, eu preciso é de dinheiro.

Passaia – E você quer defi nir isso antes da...da convenção, né?

Marçal – Não sei nem se antes da convenção, isso aí...

Passaia – você levanta a possibilidade de ainda ser estadual?

Marçal – Não, nenhuma. Sou candidato a federal. Não tem hipótese. Não tem espaço pra ser estadual, mesmo que eu quisesse, mesmo que eu quisesse. E eu não quero. E ele ta pensando que vai eleger o Júnior. Júnior não se elege nem aqui nem nunca. O PDT não faz nenhum nunca, não tem possibilidade.

Mulher não identificada – (incompreensível)

Marçal – Não, nós tamos (sic) bem hoje. Pelo que eu li no jornal, nos tamos (sic) bem. Júnior não tem chance nenhuma de se eleger, porque o PDT não faz nenhum, porque pra você eleger um federal você precisa de 150 mil votos, na legenda. Pra fazer o primeiro deputado tem que ter 150 mil. Quem que tem voto no PDT, na chapa federal? O Dagoberto esvaziou tudo.

(...)

Marçal – Tá (sic) sentindo que ele quer apoiar o Júnior?

Passaia – Não não, ele falou pra (sic) mim já. Só...o fato novo, por exemplo, é a questão de dois milhões, né? Ele tinha dito pra (sic) gente fazer um rateio entre as secretarias e oferecer uma estrutura pra te ajudar aí, entendeu? É...mas é complicado viu, Marçal, arrumar dois milhões assim. Você viu esse negócio do Geraldo, apressando pra (sic) fazer as licitações, matéria no jornal e tal, mas porque nós estávamos fi lando algumas coisas dele? É...o trecho liberado pelo Ministério tá muito baixo.

Marçal – Não, quem fi cou sabendo disso primeiro fui eu. Eu fui lá no cara lá da secretaria do Centro Oeste.

Passaia – Então, (incompreensível) conversei hoje de manhã com o Geraldinho e o Geraldinho preocupado falou: Passaia, se ele licitar nesse preço não vai ter dinheiro pra dar retorno pra ninguém não. E aí, como é que faz? E vai prejudicar é a ele mesmo.

Marçal – Passaia, o Ari tem dinheiro Passaia. É a terceira vez que eu sou deputado federal, sabe. Então vocês não vêm com essas conversas aí, terceira vez que eu sou deputado federal. Se eu tivesse sido quatro anos deputado federal ele tinha cinco millhões pra campanha, e não só dois. Então essas conversas de vocês aí não colam, entendeu? Esse negócio de conversar é conversa pra (sic) eleitor. É igual conversa do Geraldo: hã, eu não tenho dinheiro, não tenho dinheiro, to f..., não sei o que...Para, o cara é há oito anos. Ele não tem porque depois que entra no bolso da gente fi ca duro pra (sic) tirar...

Passaia – Passa a ser da gente?

Marçal – Quando sai direto de lá pra lá, tudo bem. Mas quando vem pro bolso da gente, pra tirar é duro.

Passaia – Passa a ser da gente.

Marçal – Esse é o problema. Então, o Ari tá (sic) com...com bala na agulha... muito dinheiro. Então ele tem que pensar na economia pra (sic) campanha pra (sic) prefeito dele, tem que economizar no futuro, porque se ele pensa em ser candidato a prefeito de novo, comigo a pretenso candidato a prefeito ou o
Geraldo, seja como for, vai ter que gastar muito mais do que ele gastaria se ele tivesse apoio de alguém, alinhavasse compromissos agora. Ele tem que pensar na economia que ele vai ter no futuro, isso que ele tem que pensar: hã, eu vou tirar meu dinheirinho agora, que tá guardado lá no... com a dona Maria e com
o menino lá. É... mas ele vai economizar no futuro. Isso que ele tem que pensar. Essas contas que ele tem que fazer. Dizer que tá (sic) dependente de emenda minha e aí não sei o que... para com isso.

Passaia – Não, não, com as emendas não. Eu tava falando outro assunto. Você tá ciente, o Geraldinho te explicou, que se a gente for licitar essas coisas ali... ele não vai poder te repassar nada.

Marçal – Não, foi eu que... eu que fui atrás do cara lá e os caras falaram que não tem jeito não do Ministério... vai ser aquilo lá mesmo senão o Tribunal de Contas cai de pau em cima. É aquele valor que tá lá...

Passaia – Quer dizer, emenda que você vai colocar pra isso não vai ter...

Marçal – Não vai...

Passaia – Não vai ter dez nem cinco por cento.

Marçal – É um problema, tche. Esse é o problema. Mas isso aí, essa questão das minhas emendas, nem problema do Ari é. Todo mundo sabe que a partir do momento que você coloca a emenda...

Passaia – Mas não se preocupa pelo seguinte, porque a partir que o deputado tem menos dinheiro pra fazer campanha ele tem que recorrer, ainda mais, a algum lugar, né?

Marçal – A questão é o seguinte: as minhas emendas não têm nada a ver com o Ari, minhas emendas todos sabem... o cara tem que dar um retorno pra mim, Passaia. Não adianta o Ari vir falar: Hã, dessa aqui eu vou dar... (Marçal passa a falar ao vivo na rádio).

Passaia – (incompreensível) A gente poderia conversar mas... (incompreensível).

Marçal – Por exemplo?

Passaia – Eu não vou...eu assumir um compromisso com você. Eu acho que nós temos que ter uma conversa a três aí... porque...

Marçal – Se ele tiver tomado o remédio dele no dia... tem que dar mais maracujina pra ele, mais chá de erva cidreira, o cara não consegue parar, parece que fi ca... aquele dia que ele tava aqui... ele fi cava assim... parece que ele tá ligado na tomada, parece que tem... é hiperativo.

Mulher não identifi cada – Ele não tem outro jeito. Eu nunca, eu nunca conversei com ele de outra forma.

Marçal – Não, eu já conversei.

Passaia – quando o negócio é sério... ele faz assim pra dispersar... quando o negócio é sério, é importante pra ele, daí ele (incompreensível). Vamos, vamos fazer uma reunião nós três?

Marçal – Vamos.

(...)

Passaia – É, entendeu? E aí é melhor, porque eu tive aqui e assumir um compromisso com você e... e depois ter difi culdade pra cumprir (incompreensível).

Marçal - Além desse fator, já tive um fator, tá... ruim nessa situação que é os caras ter que adiantar, que não vai ter nenhuma liberação, não teve e não vai ter. O cara adiantar pra mim já é uma difi culdade. Agora, com isso aí, é pior ainda. É que você não conta mesmo (incompreensível) só se for (incompreensível) porque ai o Ari também tem recurso dele pra (sic) fazer as coisas. Aí é diferente, ele pode fazer um compromisso com o cara, compensar alguma coisa pro (sic) cara. Mas no meu caso, eu não encontro ninguém pra fazer isso, quem que vai fazer o meu negócio e ele vai acontecer... não tem nada.

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