Mais de um quarto dos pretendentes à adoção no país já aceita adotar irmãos. É o que mostram dados atualizados do Cadastro Nacional de Adoção. Segundo a Corregedoria Nacional de Justiça, 9.834 dos 34.576 pretendentes cadastrados (ou seja, 28%) dizem estar dispostos a adotar ao menos duas crianças que aguardam juntas uma mesma família.
O índice é bem superior ao registrado cinco anos atrás. Em 2011, apenas 17% eram favoráveis a uma adoção de irmãos. O aumento do número de pretendentes abertos a esse tipo de adoção pode diminuir um pouco o abismo atual, já que 69% das crianças e dos adolescentes disponíveis nos abrigos possuem irmãos. São 4.368 de um total de 6.343 cadastrados.
Para Suzana Schettini, presidente da Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), o trabalho das entidades tem sido fundamental para essa mudança. “As pessoas têm se conscientizado de que a maioria das crianças que estão nas instituições têm irmãos, que não podem ser separados. Então os grupos de apoio têm trabalhado as famílias para recebê-los. É um trabalho que aos poucos vai rendendo frutos”, afirma.
Ela diz, no entanto, que é compreensível que nem todos se mostrem abertos a essa opção. “Há todo um contexto que precisa ser levado em conta. Muitos casais podem financeiramente adotar mais de uma criança, outros não. É tudo uma questão de limites, também psicológicos, pois os pais precisam estar preparados para duas crianças diferentes; dependendo das faixas etárias, em momentos de desenvolvimento diferentes.”
A funcionária pública Ana Izabel Ferreira da Silva, de 45 anos, teve de “amadurecer a ideia” antes de decidir embarcar com tudo nela junto do marido, o também funcionário público Lourival Júnior, de 44.
Quando se inscreveram no cadastro, Ana Izabel e Lourival queriam apenas uma criança e com no máximo dois anos. Já frequentando grupos de apoio e conversando com outros casais, eles decidiram meses depois ampliar o leque: mudaram o perfil na Vara da Infância para duas crianças, com idades até três anos. E, em meio à angústia da espera, resolveram em pouco tempo aumentar ainda mais as possibilidades, alterando para três crianças com até quatro anos de idade.
“Aí foi tudo muito rápido. A gente fez isso na sexta e na segunda já recebeu uma ligação informando que em um abrigo havia três crianças, um menino com 1 ano, uma menina com 2 e um outro menino com 3”, conta.
O “trio elétrico”, formado por Eduardo, hoje com 5 anos, Elis, 4, e Sávio, 3, mudou tudo na vida do casal. “Uns nos tacharam de loucos; outros, de heróis. Nós não somos loucos nem heróis. Nós dois queríamos filhos e eles três queriam pais. É uma troca”, diz Ana Izabel, que admite “não ser fácil”. “Tenho uma pessoa para me ajudar. Mas a adaptação foi tranquila. No abrigo a rotina já era bem regrada. Tinha hora para dormir. Tudo era feito em conjunto.”
Apesar de os gastos terem aumentado, a funcionária pública afirma também que não vê a questão financeira como um impeditivo para a adoção de mais de uma criança. “Se a gente tivesse um filho único, ele ia estar no melhor colégio do Recife. Mas decidimos por três. Hoje, eles estudam numa boa escola, não a mais top. Tudo se adequa ao orçamento”, conta.
Ana Izabel diz tratar a adoção com naturalidade nas conversas com os filhos e revela que, no início, houve resistência de alguns amigos e familiares. “Minha irmã mesmo perguntou: ‘você vai criar filhos dos outros?’. Hoje ela é a mais apaixonada por eles. Outro dia viajou ao Rio e quando chegou ao aeroporto veio direto vê-los, morta de saudade. No fim, acaba que a família toda adota também.”