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ARTIGO

Perdoar, sim

21 setembro 2018 - 14h45Por Wilson Aquino

O orgulho e a ignorância do homem impedem que ele exercite a plena caridade e o amor ao próximo a ponto de perdoar aqueles que o ferirem de alguma forma. Feliz é aquele que entende a importância e o grande benefício que recebe quando perdoa, quando entende aquele simples e ousado mandamento de Deus de que devemos perdoar até os nossos inimigos.

Dia desses num ônibus, presenciei o diálogo de duas mulheres sentadas que conversavam sobre diversas coisas, até que uma delas, a mais nova, pergunta à senhora sobre seus filhos. Isso bastou para que houvesse uma completa transformação em seu rosto, que enrijeceu fazendo surgir um olhar teso e desgostoso, mirado para o vazio e depois de alguns intermináveis segundos ela se recompôs e começou a relatar que não os via há pelo menos cinco anos e que se isolara da família por desgosto e sofrimento causados pela decepção que eles, seus três filhos, homens formados, lhes havia proporcionado.

Apesar do ônibus lotado, cheio de gente conversando sobre os mais variados assuntos e o conturbado trânsito lá fora, aquela conversa me interessou, ainda mais quando ela falava com um olhar no qual eu vi sentimentos de dor, amargura e sofrimento. Contou também que por conta disso teve que resistir ao desejo de conhecer o primeiro neto e os outros dois que vieram depois.

A curiosidade jornalística e de cidadão cristão que se preocupa com o bem-estar das pessoas me fez querer saber o por que daquela decisão tão dura. Não demorou muito para que minha curiosidade fosse saciada. Ela contou à amiga que ainda sofria muito, “mas muito mesmo”, frisara, pela morte de um quarto filho que fora assassinado por motivos fúteis. Depois contou que o assassino ficou em liberdade, respondendo pelo crime e foi aí que rompeu o relacionamento com os filhos porque nenhum deles teria tido a coragem de vingar a morte do irmão.

Inconformada e muito revoltada pelo grande sofrimento de perda e pela inércia dos demais filhos diante do assassino, resolveu abandoná-los e, segundo afirmou, continua sofrendo sozinha todos os dias e com muitos problemas de saúde.

Depois de ouvir aquelas palavras e ver aqueles olhos cheios de ódio, revolta, rancor e uma profunda tristeza, tudo ao mesmo tempo, senti o quanto aquela mulher sofria desnecessariamente. Faltava-lhe uma luz de orientação sobre o amor de Deus em sua vida.

Fui impulsionado a intervir, a falar, a tentar ajudar, mas fui impedido, pois naquele instante meu destino dentro daquele ônibus findava. Tinha que descer. Lamentei me calar e me dirigi silenciosamente e triste para a porta de saída.

Mas para minha surpresa e alegria, aquela senhorinha também se levantou e se despediu da amiga dizendo que estava indo ao médico, pois estava com sérios problemas de saúde e também se dirigiu à mesma porta. Descemos juntos e ao colocar os pés na calçada disse para mim mesmo: agora sim obedecerei à voz que sopra nossos ouvidos (Espírito Santo) para nos dizer o que fazer, para onde ir, o que evitar...

Então, sem perder tempo me dirigi a ela de forma branda e cortez para que ela não se assustasse com a abordagem de um estranho na rua. Disse-lhe que não pude deixar de ouvir seu relato há pouco dentro do ônibus sobre seu sofrimento familiar. Dessa forma ela baixou a guarda e foi tomada de curiosidade, certamente sobre o que um estranho poderia lhe dizer sobre algo tão íntimo e pessoal.

Consciente disso e aproveitando a deixa, fui direto ao assunto, dizendo-lhe que depois de refletir sobre o episódio do assassinato de um de seus quatro filhos e de sua indignação e revolta pelos demais não terem tido a coragem de vingá-lo, perguntei-lhe se já havia pensado ao menos uma vez nesses cinco anos em que está longe dos demais filhos, se um deles ou todos eles, se tivessem tentado fazer o que ela desejava, se não estariam presos ou até, quem sabe mortos também?

Sem esperar resposta disse-lhe mais:

- A senhora chora a perda de um filho, mas ignora a existência e o privilégio da convivência com outros três que estão vivos e que também sofrem não só a perda do irmão, mas também a perda da própria mãe;

- A senhora sobrepôs a sua mágoa, sua decepção à frente do amor pelos filhos e até de seus netos que chegaram saudáveis e felizes e que hoje correm e brincam por onde andam. Já pensou nisso?

-Já pensou também em quanto amor e alegria perdeu no dia a dia  em família por conta desse ódio e rancor que plantou em seu coração?

- A senhora se privou da vida por conta de que exatamente?

-Todo ódio, todo rancor que guardamos dentro de nós eclodem em forma de doenças, de males diversos por todo o corpo. A senhora que se dirige hoje ao médico, nunca pensou que seus problemas de saúde podem estar sendo provocados por esses sentimentos ruins que nutre em vosso próprio corpo, mente e alma todos os dias?

- Nunca ninguém lhe mostrou passagens da Bíblia em que Deus nos ensina que devemos amar e perdoar até os nossos inimigos?

-A senhora nunca sentiu o prazer do perdão que é como um elefante que tiramos de nossas próprias costas e que nos dá um grande sentimento de leveza e alegria, quando perdoamos nosso próximo?

- Minha senhora, me perdoe por dizer essas coisas, mas aceite esse conselho desse desconhecido e perdoe esse crime. Se reconcilie com seus filhos, com sua família e procure conhecer melhor o que Deus tem de bom para a senhora e seja feliz.

No final, aquela senhorinha me olhou com os olhos esbugalhados e, boquiaberta, apenas perguntou:

- Quem é o senhor?

Respondi:

- Apenas uma pessoa que realmente deseja que a senhora e sua família sejam felizes e que aprenda a perdoar e a amar a vida.

*Este artigo é de inteira responsabilidade de seu autor, e não expressa a opinião deste site.

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